Exposição - "A Fragilidade do Poder" - 2012 - Galeria Movimento - Rio de Janeiro - RJ
A Fragilidade do Poder
Narrativas
indisciplinadas
Felipe Scovino
Estamos diante de um repertório que compreende uma mistura de algo veloz e violento, irônico e dramático, real e ao mesmo tempo fora de uma ordem que se espera das imagens que compõem o mundo nas pinturas de Arthur Arnold. Suas obras tornam aparentes uma disputa de poder nas suas mais variadas representações. Estas são firmes mas nunca disciplinadas, pois há uma relativa ambiguidade entre um traço seguro e persistente e a ideia de um núcleo urbano. Em uma mesma tela podem habitar dados simbólicos ou representações tão (aparentemente) díspares quanto o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Damien Hirst, um tubarão que faz referência ao clássico filme dos anos 80 e à sua namorada posando com um objeto híbrido, que fica entre um abridor e uma máscara africana. Aos poucos, essas diferenças encontram uma trajetória – mesmo que difusa - que os une, seja por conta da história da arte ou de algo que surpreendentemente faz parte do nosso cotidiano, como o voyeur que está sempre a nos espreitar nesse tempo de vigilância e insegurança.
Mas mesmo nessa aparente dispersão, Arnold nos oferta uma pintura que tem por vocação dirigir o olhar e percepção do espectador justamente para o que ocorre no mundo mesmo que essa “lente” nem sempre esteja tão límpida quanto nós esperamos. Mas fundamentalmente o mundo é constituído por essas ambivalências, fraturas e o que julgávamos serem incoerências. Em suas pinturas, o estranhamento e a diferença são os fios condutores dessas pequenas narrativas que acabam se interligando.
Em “Cafezinho na casa do Seu Pereira”, estão lado a lado ícones fetichistas (a bota, sendo usada por um, digamos, excêntrico senhor que apropriadamente representa ao mesmo tempo a imagem de um dominador, em referência ao terreno do sexo, e dos antigos “coronéis” do Nordeste) e notadamente eróticos (a pose “descontraída” e ao mesmo tempo sedutora da moça ou o nu da mulher) ou cenas de violência, visíveis tanto numa cena de execução efetuada por um mascarado como na ambivalente figura do cão que guarda (ou aponta?) um canivete. No final, essas narrativas acabam por firmar um compromisso com várias representações de poder que se disseminam no campo do sexo, violência, dominação ou política.
Ou ainda a violência pode transparecer numa inversão de funções como em “Paranóia”, quando as galinhas deixam sua função doméstica, passiva e de alimentação aos seres humanos e passam a atacar de forma violenta os estudantes em um camping. O que sempre foi caça torna-se caçador. Em uma narrativa surreal – o cenário ainda apresenta uma pista de aeroporto e a hélice de um avião -, a pintura de Arnold também estabelece uma relação cromática que foge aos padrões comuns. Mais um desvio ou ainda outra relação de poder sendo exibida e/ou desconstruída pelo artista.
Se
a “responsabilidade” da arte é ser um constante enigma, a pintura de Arnold,
ainda no início de uma trajetória, cumpre essa função. As distintas
representações do poder – suas perversidades e fragilidades – estão lá, ainda
que de forma difusa e nem sempre literal, para nos questionar sobre o que
envolve o mundo.
Comentários
Postar um comentário