ArPa - Feira de Arte - 2024 - Galeria Matias Brotas
A terceira edição da ArPa aconteceu entre os dias 26 e 30 de junho em um espaço de eventos enorme embaixo do estádio do Pacaembu em São Paulo. Participaram 55 galerias, dentre elas a Matias Brotas. A galeria capixaba apresentou trabalhos dos artistas Arthur Arnold, Adriana Eu e José Bechara. O stand, que foi um dos destaques da feira, contou curadoria e texto de Agnaldo Farias e pode ser lido abaixo.
São três artistas, três vozes, três maneiras de abordar o mundo. Arthur Arnold, Zé Bechara e Adrianna Eu. Os três são cariocas mas Arthur e Adrianna estão radicados em São Paulo, apenas Bechara, bafejado pela sorte, segue agarrado aos altos da Gávea. Arthur é um pintor na acepção clássica, figurativo, apoiado numa tradição milenar cujas vertentes ele, coerente com uma certa compreensão muito contemporânea, embaralha como quem gosta de montar quebra-cabeças desde que misturando dois ou três diferentes. Não que suas pinturas, algumas delas com grandes dimensões, incorporem procedimentos distintos, não é bem isso, mas diferem entre si como que se fossem produzidas por gente diversa. E há pelo menos dois denominadores comuns: a primeira refere-se ao seu gosto por acumulações de motivos - pessoas e coisas. Suas telas são carregadas de multidões, silhuetas humanas mais ou menos definidas, invariavelmente aglomeradas, como acontece em toda parte, nas ruas centrais das grandes cidades, nos blocos de carnaval, nas lotações. Reforçando a ideia de que os objetos correspondem a nós mesmos, vêm suas telas com mesas repletas de pratos, talheres e comidas, muitas comidas, compondo uma imensa paisagem doméstica. O segundo denominador comum decorre de seu evidente prazer em abrir a paleta de cores e gestos na abordagem desses assuntos, um jogo de protagonismo cambiante entre o que é representado e o modo de fazê-lo.
Bechara perscruta a pele do mundo. Grande parte de suas pinturas, desenhos, esculturas e instalações faz uso de matérias oxidadas, elementos instáveis, algumas à beira do colapso. Interessa ao artista o desenvolvimento interno dos materiais, a peculiaridade de seu atrito com os elementos, a troca permanente que há entre as coisas, a começar pelo suor excessivo do nosso corpo sob o sol carioca, encharcando nossas roupas, provas de um equilíbrio tenso e efêmero. As faixas, retículas, compostas por linhas retilíneas e nítidas de espessura variável, os planos geométricos, alguns deles vazados, reduzidos aos contornos, outros recobertos de azuis, vermelhos e verdes, entre outras cores vivas, repicam nas retinas como fulgurações, esforços racionais, luminosos porém vácuos que produzimos no interior da nossa noite escura, em alguns casos, quando se trata da ferrugem do ferro, marrom profundo, em outros, quando se trata da corrosão do cobre, verde. E porque sua própria pesquisa é fundada na insatisfação, dessa vez, o artista traz uma escultura pautada na instabilidade, um paralelepípedo de mármore branco de bordas ásperas com uma semiesfera escavada na sua face superior, ao lado de uma esfera da mesma matéria cujo diâmetro é levemente maior. Como poderia ser colocada de volta se a rigor ela não cabe? O enigma do Eu aposto ao seu Adrianna sugere que a poética dessa artista estende-se ao seu próprio nome. E se aqui, nessa exposição condensada de seus trabalhos, o foco recai sobre as artes visuais, o leitor deve ter em mente que ela trafega pela literatura com igual desenvoltura. Eu ficou conhecida pelo uso de linhas, sanguíneas, como se pode ver, emaranhadas em rolos mais ou menos embaraçadas, em alguns casos estiradas e pendendo do furo de agulhas, de pequenas a agigantadas. Será preciso ressaltar a alusão ao cordão umbilical, à conexão mantida entre a mãe e o feto, quando este está colado e depois encaixado no calor do útero, casa primeira com suas paredes de carne e sangue? E o que dizer da costura, desse exercício superior fundado no estabelecimento de contato, na união de partes disjuntas, daquilo que trazemos para
junto de nós, porque nos falta, porque sem essas partes ainda somos mais inconclusos. O desejo por tudo vai na razão inversa do medo da solidão, o que faz do amor, porque a costura é uma prática amorosa, um antídoto. Em acordo com o descolamento de si embutido no nome adotado para ela própria, a artista apresenta alguns trabalhos pautados no uso do espelho, esse lugar estranho, imponderável, perturbador que também somos capazes de estar. Como recuperar a integridade do nosso ser cindido? Agnaldo Farias
A galeria também produziu vídeos onde os artistas falam um pouco sobre seus trabalhos, aqui segue o de Arthur Arnold.
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